Ativista e política brasileira Marielle Franco, assassinada em 14 de março. Foto: Telam.
Durante seu governo, o ex-presidente Jair Bolsonaro disse ao seu complexo diplomático e às embaixadas brasileiras na Europa para pressionar a mídia estrangeira – especialmente o La República de Italia – por dar demasiada importância ao assassinato da vereadora socialista Marielle Franco no Rio de Janeiro. março de 2018, que o deixou sob um manto de suspeita.
A diretriz recebida pelo corpo diplomático brasileiro visava o benefício particular do partido do presidente Bolsonaro. Paralelamente, reclamou à mídia estrangeira -antes da cobertura de Franco- que não deram a devida importância à facada que recebeu durante a campanha eleitoral, ataque que por sinal é suspeito de ser falso: Lula da Silva ele mesmo, sempre cauteloso em suas denúncias, expressou suas reservas.
Os políticos também levaram reclamações sobre Franco às embaixadas brasileiras na Europa. A embaixada brasileira na França, em particular, reclamou fortemente desse “tratamento diferenciado” dado aos dois casos, tentando colocar Franco e Bolsonaro no mesmo patamar, como vítimas equivalentes.
Esses dados fazem parte dos telegramas diplomáticos que foram colocados em sigilo centenário pelo governo Bolsonaro e que foram revelados pelas redes SBT e CNN Brasil, que os obtiveram a partir de decisão judicial baseada na lei de acesso ao público informações e autorização do governo do presidente Lula da Silva.
Segundo a Justiça, Marielle Franco foi assassinada no dia 14 de março de 2018 por dois ex-policiais de quadrilhas parapoliciais, agora detidos, que saíram para cometer o assassinato do mesmo bairro fechado da Barra da Tijuca onde Bolsonaro, que era candidato à presidência , tem sua residência.
Na época do assassinato, a segurança do Rio de Janeiro estava a cargo do general Walter Braga Netto, que era vice-candidato de Bolsonaro em 2022. Até o momento não se sabe quem ordenou o assassinato de Marielle Franco.
O sistema diplomático do Palácio do Itamaraty registrou um telegrama do embaixador do Brasil na França, Luis Fernando Serra, declarando “indignação” com os partidos políticos franceses que foram à sede diplomática questionar sobre o andamento da causa franquista. O embaixador escreveu na época ao Itamaraty em Brasília: “Ressaltei nas cartas (a políticos franceses) minha profunda indignação com o tratamento díspar em relação aos crimes”, tentando mostrar que Bolsonaro havia sido tanto vítima quanto Franco por ter recebido uma faca, ou como se uma coisa compensasse a outra.
As embaixadas brasileiras na Suíça, Itália e Alemanha também responderam à mídia e aos líderes políticos sobre o caso Franco. O assassinato do ativista foi um dos crimes políticos mais importantes da história do Brasil: marcou o prelúdio da ascensão da ultradireita ao poder, coincidindo com a prisão e expulsão de Lula em 2018, condenado pelo então juiz Sergio Moro, depois ministro de Bolsonaro.
A CNN Brasil informou que teve acesso a 700 páginas de telegramas desde 2018, quando governou Michel Temer, que indicavam o impacto negativo do crime de Franco e seu motorista, Anderson Gomes, na opinião pública internacional e na imagem do Brasil.
Como vai o caso?
O ministro da Justiça brasileiro, Flavio Dino, prometeu ir a fundo para esclarecer o assassinato do ativista brasileiro. “É uma questão de honra para o Estado brasileiro envidar todos os esforços para que saibamos quem matou e mandou matar Marielle Franco no Rio de Janeiro”, disse Dino.
Em 6 de abril, a justiça brasileira rejeitou um pedido da defesa de dois ex-policiais presos pelo homicídio para que fossem libertados pelo tempo que já estavam presos. A 4ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve as prisões preventivas do sargento reformado da Polícia Militar Ronnie Lessa e do ex-policial militar Élcio Queiroz.
Enquanto era vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, uma afrodescendente nascida em uma favela, era uma delatora regular dos grupos parapoliciais ou “milícias” que atuam nessas comunidades humildes. Ela foi assassinada em uma emboscada no centro do Rio de Janeiro por Lessa e Queiroz, ambos ligados a essas milícias, em um caso que tinha ligação com o presidente Jair Bolsonaro. Logo após tomar posse como presidente, Lula nomeou Anielle Franco, irmã de Marielle, como Ministra da Igualdade Racial.
cem anos de segredos
O governo de Lula determinou a cessação dos segredos por cem anos ditados por Bolsonaro. Como resultado dessa decisão, o governo brasileiro afirmou que há histórico de vacinação contra a covid-19 do ex-presidente Bolsonaro na administração pública, que durante a pandemia havia dito que não iria se imunizar e fez campanha contra sua eficácia.
O ministro da Controladoria Geral da União (CGU), Vinicius de Carvalho, esclareceu que está sendo apurada a veracidade dos documentos que estão nos arquivos da entidade. Bolsonaro manteve sua caderneta de vacinação em segredo por cem anos e se posicionou contra a obrigatoriedade da vacina: tinha orgulho de dizer que seria o último a recebê-la.
O registro da CGU indica que Bolsonaro teria recebido a dose única do laboratório Janssen no dia 19 de julho de 2021, em um pronto-socorro em Perus, na zona norte de São Paulo. Na véspera, Bolsonaro havia recebido alta após passar quatro dias internado por obstrução gástrica em um hospital particular de São Paulo.
Indígenas protestam contra o governo brasileiro e exigem respeito aos seus direitos humanos, Brasília, 9 de abril de 2022. Antonio Molina/Fotoarena/Sipa USA / Legion-Media
A Suprema Corte do Brasil suspeita que ex-funcionários do governo também cometeram crimes ambientais contra comunidades indígenas.
O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, deu ordem nesta segunda-feira para investigar o possível envolvimento de funcionários do governo de Jair Bolsonaro em crimes de genocídio e crimes ambientais relacionados à vida, saúde e segurança de comunidades indígenas, como bem como possível desobediência e violação de sigilo sumário.
Os responsáveis pelas investigações cabíveis serão o Procurador-Geral da República, Augusto Aras, o Ministério Público Militar, o Ministério da Justiça e Segurança Pública e a superintendência regional da Polícia Federal em Roraima.
Os documentos que serão encaminhados às referidas entidades no âmbito da investigação “sugerem um quadro de absoluta insegurança dos indígenas envolvidos”, além das ações ou omissões ilegais das autoridades federais brasileiras que agravaram a situação.
Como alguns exemplos, Barroso citou a publicação no Diário Oficial, pelo então ministro da Justiça Anderson Torres, da data e local de uma operação secreta de intervenção em terras indígenas, além dos indícios de alteração do planejamento em pleno funcionamento em curso no município de Jacareacanga contra pessoas que extraíam ouro ilegalmente. Isso resultou em um alerta aos garimpeiros ilegais, o que comprometeu a eficácia da medida realizada pela Força Aérea Brasileira.
O ministro do Supremo Tribunal Federal também reiterou a ordem de retirada de todos os garimpos ilegais das terras indígenas Yanomami, Karipuna, Uru-Eu-Wau-Wau, Kayapó, Arariboia, Mundurucu e Trincheira Bacajá, priorizando as áreas onde a situação é mais grave.
Somente nos Yanomami foi registrada uma grave crise humanitária para os indígenas, que sofriam de desnutrição, infecções por malária e registravam alto índice de mortalidade. Além disso, o mercúrio usado no garimpo ilegal contaminou fortemente os rios da região.
O presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, reuniu-se hoje com seu homólogo brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, na Argentina. Foto: Presidência/Twitter
O presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, reuniu-se hoje com seu homólogo brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, na Argentina, no âmbito da VII Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac).
Este é o primeiro encontro entre os dois chefes de Estado, depois de Lula da Silva ter assumido novamente a presidência do Brasil, em 1º de janeiro, informou a Presidência na rede social Twitter.
O encontro entre @DiazCanelB e @LulaOficial acontece no âmbito do VII #CELAC Summit.
Eles já haviam falado ao telefone várias vezes. A última dela por ocasião dos atos violentos ocorridos no #Brasil.
Segundo a Presidência de Cuba, eles já se falaram por telefone em diversas ocasiões, a última após as ações golpistas realizadas por seguidores do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Neste dia, Díaz-Canel comemorou o retorno do Brasil à Celac e expressou seu apoio e solidariedade a Lula diante dos atos violentos e antidemocráticos que buscavam gerar o caos e desrespeitar a vontade da maioria de seu povo.
Na véspera, o presidente brasileiro condenou o bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos à nação caribenha há mais de seis décadas.
O presidente cubano manteve um encontro na Argentina com a presidente de Honduras, Xiomara Castro de Zelaya. Foto: Presidência/Twitter
O presidente cubano também manteve uma reunião na terça-feira com o presidente de Honduras, Xiomara Castro de Zelaya.
Ambos os presidentes se reuniram na Argentina durante a participação na VII Cúpula da Celac, informou a conta do Twitter da Presidência cubana.
Durante seu discurso no plenário, Castro havia levantado a voz condenando o bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto a Cuba por mais de seis décadas pelos Estados Unidos.
O novo presidente do Brasil e líder máximo do Partido dos Trabalhadores enfatizou o caráter disciplinado e democrático das massas de esquerda. Foto: O Colombiano
Lula disse no último domingo, 8 de janeiro, quando as turbas extremistas dos bolsonaristas rebeldes ainda ocupavam e destruíam as três sedes do poder em Brasília, que “a esquerda nunca invadiu as cadeiras do Congresso, do Supremo Tribunal Federal e da Presidência da República”. ele próprio perdeu, em circunstâncias questionáveis, várias eleições presidenciais (1989, 1994, 1998), ou quando foi preso sob falsos pretextos para impedi-lo de concorrer às eleições de 2018…
Com esta declaração, o novo presidente do Brasil e líder máximo do Partido dos Trabalhadores sublinhou o carácter disciplinado e democrático das massas de esquerda e, sobretudo, o sentido de responsabilidade das lideranças de esquerda que, em regimes democráticos, nunca chamaram a legião de seus partidários ao poder da tempestade.
Na história da esquerda mundial, nem sempre foi assim. Basta recordar dois assaltos fundadores perpetrados pelas massas populares revoltadas durante as duas principais revoluções da história: a tomada da Bastilha (1789) na revolução francesa, e o assalto ao Palácio de Inverno (1917) na revolução russa .
Claro, em ambos os casos, tratava-se de insurreições populares contra poderes autocráticos: a do rei Luís XVI na França e a do czar Nicolau II na Rússia. Não contra os regimes democráticos. Portanto, Lula está certo.
Mas outra observação que poderia ser feita é que nunca, também, massas de sediciosos de ultradireita lançaram o ataque insurrecional ao poder. Até agora, a extrema direita tomou o poder por meio de golpes de Estado diretamente executados pelas forças armadas ou por um partido extremista de tipo paramilitar (como os fascistas de Benito Mussolini na Itália em 1922 ou os nacional-socialistas de Adolf Hitler na Alemanha em 1933). apoiado pelas forças armadas.
A novidade -como aconteceu em particular em 6 de janeiro de 2021 em Washington com o assalto ao Capitólio, e em 8 de janeiro de 2023 em Brasília com o assalto à sede dos Três Poderes- é que agora a nova extrema direita é capaz de organizar insurreições populares como instrumento de golpe para a conquista do poder.
Ou seja, é como se, de repente, a rebelião tivesse virado para a direita… (1) O que aconteceu para que algo semelhante fosse possível? Isso é o que tentei explicar em meu recente livro “A era da conspiração” (2). Uma era em que as redes sociais exercem uma influência mental e psicológica como nunca antes a imprensa, o rádio, o cinema ou a televisão. No novo universo dos memes e da pós-verdade, é cada vez mais difícil distinguir o verdadeiro do falso, a realidade da ficção, o autêntico do manipulado, o certo do provável, o cômico do sério, o objetivo do o subjetivo, o bom do ruim, o verdadeiro do duvidoso… Esse flagelo das falsidades online favorece a disseminação de teorias da conspiração delirantes. Que está corroendo aos trancos e barrancos os fundamentos da democracia.
O que está acontecendo se assemelha, em certa medida, ao que Sigmund Freud chamou, em 1930, de mal-estar na cultura (3) . No fundo, o assalto dos trumpistas ao Capitólio em Washington e o ataque dos bolsonaristas à sede dos Três Poderes em Brasília são os exemplos mais eloquentes e significativos do atual mal-estar de nossa civilização baseada, em princípio, em valores democráticos. mas também nas tecnociências, na razão e no progresso… que também estão em crise.
A confusão atual do capitalismo neoliberal somada à confusão causada pela aceleração desenfreada das tecnologias de comunicação estão abrindo um período sem precedentes de instabilidade social, extrema polarização e grande confusão política. A desconfiança no sistema dominante continua a se espalhar. Nos Estados Unidos, pesquisas sociológicas recentes revelam que mais de 25% dos cidadãos estão dispostos a renunciar à democracia em favor de um líder dominador que “faz o que precisa ser feito”… Estima-se que pelo menos 50% dos eleitores republicanos aceitaria um regime autoritário, não democrático… E no Brasil, apenas 20% dos cidadãos acreditam que a democracia pode resolver os problemas do país…
Muita gente, mesmo da direita (4) (que é novidade), está buscando alternativas anti-establishment. E todos esses processos foram intensificados nos últimos dois anos pela pandemia global de Covid. O atentado ao Capitólio em Washington e o assalto aos Três Poderes de Brasília fazem parte desse clima de período também marcado por extrema polarização, intolerância social, discurso de ódio, obsessões conspiratórias e violência discursiva.
Como escreve o cientista político argentino José Natanson: “Muitas coisas têm que acontecer para que algo assim aconteça(5) ” Embora a relação entre um clima social e um episódio criminal nunca seja automática ou linear. Porque não existe um determinismo sociológico absoluto, e porque o contexto socioeconómico nunca determina totalmente. Mas não há dúvida de que cria a atmosfera e o ambiente que permitem explicar e dar sentido às ações dos agentes sociais. Nesse caso, os delírios paranóicos verbais de Trump e Bolsonaro, suas mentiras constantes, suas conspirações malucas aceleraram um fenômeno político muito contemporâneo: a polarização social extrema, o aumento da intolerância, o aumento do confronto violento e a invocação do ódio como discurso dominante. É por isso que as massas populares agora são seduzidas pelo discurso racista de extrema-direita que destrói sua consciência de classe. A oposição entre identidade étnica e classe social é interessante e absurda. Mas, em meio a tanta confusão, ela produz efeitos e esses efeitos, por sua vez, produzem algo novo: massas protestantes de ultradireita. Que arrebatam a rua e a epopéia da insurreição da própria esquerda.
É por isso que consideramos que o assalto ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021 em Washington constitui um divisor de águas, um marco, uma linha divisória na história da democracia. Há agora um antes e um depois dessa data no estudo das patologias contemporâneas do sistema democrático (6). Embora também seja verdade que este assalto não foi o primeiro dos recentes ataques contra edifícios-símbolo nas grandes democracias ocidentais. Sendo a de Brasília a mais recente.
A série de agressões talvez tenha começado em Paris (França) em 1º de dezembro de 2018, durante o terceiro dia de uma onda de protestos sociais contra o aumento do preço dos combustíveis. Naquela ocasião, no coração da capital francesa, várias centenas de “coletes amarelos” enfrentaram apedrejados as forças da ordem, um grupo social muito heterogêneo que incluía trabalhadores indignados, sindicalistas furiosos, elementos de ultradireita, conspiradores profissionais e infiltradores provocadores. Naquele dia, os manifestantes anti-establishment tentaram inicialmente atacar o Palácio Eliseo, sede da Presidência da República. Mas foram repelidos com canhões de água e gás lacrimogêneo pela tropa de choque das Companhias de Segurança Republicanas (CRS). Enquanto isso, outros “coletes amarelos” mais radicais -alguns encapuzados- lançaram-se ao assalto a outro dos edifícios-símbolos mais sagrados do Estado francês: o Arco do Triunfo, construído por Napoleão e localizado no alto da Champs-Élysées, sob cujo Vault contendo o túmulo do Soldado Desconhecido. Enquanto avançavam em meio a escaramuças em direção a esse monumento, os manifestantes quebraram várias vitrines e incendiaram dezenas de veículos. Numa atmosfera enfumaçada de caos, gritaria e desordem, os “coletes” chegaram a incendiar algumas das mansões que margeiam a Place de l’Etoile… Derrubaram as barreiras de proteção… Enfrentaram as forças da ordem. No meio de uma feroz batalha campal, eles recuaram enquanto os insurgentes conseguiram invadir a praça, assaltar e ocupar o Arco do Triunfo… Eles saquearam parte do monumento…
Eles destruíram uma venerada estátua de Marianne, uma das alegorias da República Francesa… Agitando bandeiras de vitória, os grupos anti-establishment alcançaram o telhado com vista para toda Paris. Finalmente, eles cobriram o monumento sagrado com dezenas de pichações vingativas: “Macron, renuncie!”, “Os coletes amarelos triunfarão!”
Essas imagens deram a volta ao planeta. Diante do espanto universal. Por alguns momentos, uma das grandes democracias do mundo deu a impressão de cambalear… De estar à mercê de um grande e determinado grupo de insurgentes violentos…
Dois anos depois, um novo ataque ocorreu contra outro edifício altamente simbólico. Aconteceu no sábado, 29 de agosto de 2020, em Berlim (Alemanha), em meio à epidemia de Covid-19. Naquele dia, cerca de quarenta mil manifestantes, representantes de uma mistura diversificada de grupos anti-vacina, incluindo libertários, extremistas de direita e uma multidão de teóricos da conspiração, desabaram no centro histórico da capital alemã entoando slogans contra as restrições impostas devido ao coronavírus pelo governo federal.
Depois que a polícia dispersou a manifestação, várias centenas de membros de várias organizações de extrema-direita lançaram um assalto a um dos edifícios mais emblemáticos e cheios de história de Berlim, o Reichstag (7), sede do Bundestag, Parlamento Federal alemão. Com crueldade e fúria, os extremistas violentos romperam as barreiras de segurança erguidas em torno do Parlamento e invadiram os degraus que levam ao famoso prédio. Aglomeraram-se violentamente diante das portas, embora não conseguissem penetrá-las. Entre os assaltantes extremistas, estavam neonazistas e membros de organizações nacionalistas, movimentos identitários e o Reichsbürger (“Cidadãos do Reich” que não reconhecem as fronteiras alemãs, nem a atual ordem constitucional federal (8)), portadores de identidade negra bandeiras, branco e vermelho do antigo império alemão (1871-1918) dissolvido em 1919 após a Primeira Guerra Mundial.
A intenção de invadir a sede parlamentar havia sido anunciada nas redes sociais dias antes da manifestação. Por sua enorme carga simbólica, as imagens desse atentado ganharam manchetes internacionais e impactaram a opinião pública democrática mundial. Isso aconteceu apenas cinco meses antes da invasão do Capitólio de Washington. Certamente serviu de modelo para apoiadores de Donald Trump e de grupos supremacistas brancos e neonazistas americanos.
Por sua vez, após 6 de janeiro de 2021, os acontecimentos no Capitólio inspiraram novos ataques – perpetrados pelo mesmo tipo de assaltantes extremistas anti-establishment motivados por teorias da conspiração, em circunstâncias muito semelhantes – a outros edifícios simbólicos em diferentes países. Podemos citar pelo menos outros dois casos além do recente de Brasília, também diretamente inspirados, até hoje, pelo assalto ao Capitólio.
Primeiro, aquele ocorrido em 9 de outubro de 2021 -ou seja, nove meses após o ataque em Washington-, quando militantes neofascistas de extrema direita aproveitaram uma manifestação massiva em Roma (Itália), convocados para protestar contra a obrigatoriedade certificado de vacinação anti-covid, para tentar assaltar primeiro o Palácio Chigi (sede do governo italiano e residência do
Presidente do Conselho de Ministros) e, em seguida, atacaram violentamente a histórica sede nacional da Confederação Geral do Trabalho da Itália (CGIL, na sigla em italiano), o principal sindicato do país.
Houve bombas de gás lacrimogêneo e policiais de choque. Os manifestantes responderam atacando a polícia e as forças de segurança, atirando-lhes pedras, garrafas, tochas… Centenas de ativistas, principalmente dos grupos neofascistas mais violentos, instigados por militantes do partido Forza Nuova, conseguiram entrar no sindicato construíram e saquearam e destruíram -como foi feito depois em Brasília-, os arquivos e os escritórios. Em uma combinação de reivindicações delirantes, teses de conspiração e apelos ao caos, os neofascistas italianos recorreram às redes sociais para tentar – contando com notícias falsas e distorções da realidade – manipular a raiva e a insatisfação da população. Por meio de mensagens do Telegram, eles convocaram a mobilização e o ataque, referindo-se diretamente aos eventos realizados, nos Estados Unidos, pelos fãs de Donald Trump. Por sua vez, os organizadores dessa agressão admitiram que suas estratégias foram diretamente inspiradas no assalto ao Capitólio.
O segundo ataque ocorreu alguns meses depois, em 29 de janeiro de 2022, em Ottawa (Canadá), quando cerca de quinhentos caminhoneiros (9) -revoltados com uma nova regra que exigia que os motoristas fossem vacinados contra a Covid para cruzar a fronteira- entre o Estados Unidos e Canadá – ocuparam o núcleo central daquela cidade e bloquearam o prédio da Parliament Hill, sede do Parlamento canadense. Logo, esse “Comboio da Liberdade” foi acompanhado por milhares de outros manifestantes, a maioria brancos de extrema direita com bandeiras nazistas e confederadas, faixas pró-Donald Trump (!) e uma infinidade de logotipos de QAnon, que se declararam a favor dos brancos nacionalismo com um discurso decididamente antigovernamental, conspiratório, supremacista, sexista, xenófobo, racista e anti-socialista… E também se referiam diretamente ao assalto ao Capitólio.
Segundo as autoridades, muitos dos manifestantes cometeram crimes de ódio, racismo e danos materiais. Durante o primeiro fim de semana, vários desordeiros chegaram a profanar – como na França – o Túmulo do Soldado Desconhecido… entre outros, os apoiaram publicamente (10) . Diferentes grupos anti-establishment também apoiaram o bloqueio de Parliament Hill, em particular a organização conspiratória Action4Canada, que sustentou que a pandemia “foi obra, pelo menos em parte, de Bill Gates e da ‘Nova Ordem Mundial (Econômica)’ para facilitar a injeção de microchips, habilitados para 5G, na população” (11)
Embora muito diferentes entre si, esses ataques a prédios-símbolos respondem, como vimos, a um modus operandi semelhante que se confirmou no dia 8 de janeiro em Brasília com o ataque das massas de Bolsonaro à sede dos Três Poderes (embora, neste caso, a provável intenção dos bolsonaristas era provocar a intervenção das forças armadas e transformar seu protesto insurrecional em um golpe tradicional).
Hoje -não só nos Estados Unidos ou no Brasil- o ódio circula clandestinamente em nossas sociedades. Ele flui em todos os lugares. Ele rega a paisagem política. Não é exclusividade de um partido ou de um líder. O problema se agrava, como muito bem observa José Natanson, quando um líder, um partido ou um comunicador – ou seja, alguém com poder na discussão pública – mobiliza esse ódio contra um grupo social, uma ideologia ou uma pessoa específica. Essa é a dimensão neofascista do momento atual. Porque a ultradireita voltou a fazer do ódio a sua principal ferramenta de construção política.
O estudo desses atentados contra o coração da democracia nos Estados Unidos, França, Alemanha, Itália, Canadá e Brasil -e as circunstâncias que os originaram- permite explorar, com prudência, o principal triângulo da inquietação contemporânea: a crise da verdade, a crise da informação, a crise da democracia. Essas três crises existenciais, articuladas entre si, afetam hoje, de uma forma ou de outra, quase todas as nações (12)
Tanto mais que o (mau) exemplo vem dos Estados Unidos. E se algo quase não existe exceção há um século, é a capacidade do modelo americano -em termos de cultura popular, moda, consumo, comunicação e marketing político- ser imitado e replicado em todos os lugares…
Ainda mais, obviamente, na era da Internet, da web e das redes sociais, um ecossistema cultural e de comunicação fundamentalmente criado e desenvolvido nos Estados Unidos, e que se descontrolou…
É por isso que é tão urgente impedir a disseminação de conteúdo conspiratório mentiroso e prejudicial nas redes. Temos uma escolha a fazer agora: vamos deixar nossas democracias murcharem? Ou podemos melhorá-los? Porque isso vai piorar. Ele se tornará muito mais complexo à medida que a Inteligência Artificial (IA) progredir e se tornar cada vez mais sofisticada. Consequência: será cada vez mais difícil detectar e denunciar teorias da conspiração, manipulações e desinformação. Isso fará com que se repitam os ataques enraivecidos das massas conspiradoras de ultradireita, cada vez mais fanáticas, contra as sedes dos poderes democráticos… Até quando?
Milhares de bolsonaristas entraram violentamente nas sedes do Parlamento, da Presidência e do Supremo Tribunal Federal. Foto: EFE
Pelo menos 1.200 integrantes de Bolsonaro foram detidos nesta segunda-feira no acampamento que montaram em frente ao quartel-general do Exército em Brasília desde as eleições de outubro e de onde foram lançados os ataques de domingo contra os quartéis-generais dos três poderes no Brasil.
Os seguidores do ex-presidente Jair Bolsonaro, que não reconhecem a vitória do líder progressista Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais, foram presos após serem cercados pela Polícia e pelo Exército, desmantelaram pacificamente o acampamento onde se refugiavam .
Segundo o Ministério da Justiça, os integrantes de Bolsonaro detidos foram levados em pelo menos 40 ônibus até a sede da Polícia Federal, onde serão identificados para tentar apurar se participaram dos violentos ataques de domingo e arquivados caso surjam provas contra eles no futuro. .
Só permanecerão presos os que forem identificados como participantes dos atos de vandalismo e aqueles que tiverem alguma prova contra eles.
Os prisioneiros se juntarão às quase 300 pessoas que foram presas no domingo por sua responsabilidade nos ataques.
O despejo foi pacífico e ocorreu depois que o desembargador Alexandre de Moraes, um dos onze integrantes do STF, ordenou o desmantelamento de todos os acampamentos montados pelos bolsonaristas em frente ao quartel do país e de onde defendiam um golpe. Brasil contra Lula.
Moraes, responsável por várias das investigações contra Bolsonaro e seus seguidores por ataques à democracia, ordenou que os ocupantes dos acampamentos “sejam detidos em flagrante pela prática de diversos crimes”.
O acampamento dos radicais em Brasília, montado há mais de 70 dias, desde que Lula venceu no segundo turno das eleições presidenciais, serviu de base para os manifestantes que invadiram a sede dos três poderes do Brasil no domingo e foi o alvo lugar para onde retornaram após sua tentativa fracassada de forçar um golpe.
O número de radicais no acampamento em frente ao quartel-general do Exército vinha caindo desde a posse de Lula, em 1º de janeiro, e na quinta-feira as autoridades contabilizavam cerca de 200 pessoas, mas no sábado saltou para cerca de 3 mil depois que os bolsonaristas convocaram a manifestação de domingo.
Diante do caos gerado pelo assalto a prédios públicos, Lula decretou intervenção federal na área de segurança de Brasília até 31 de janeiro, com a qual a polícia regional ficará sob controle do governo federal.
O assalto ao Congresso, à Presidência e ao STF só foi resolvido após quatro horas e meia de confusão, quando agentes de choque fizeram investidas e dispararam gás lacrimogêneo contra os exaltados que estavam dentro e fora dos prédios dos três poderes.
Uma semana após assumir o poder, Lula enfrenta uma das primeiras crises políticas de seu terceiro mandato.
Motins no distrito administrativo de Brasília (Brasil), em 8 de janeiro de 2023.
O ataque contundente ao Capitólio dos Estados Unidos já tem sua contrapartida na América do Sul. Neste domingo, uma multidão vestida com camisas ‘verdeamarelas’ invadiu as três sedes emblemáticas do poder político em Brasília: o Palácio do Planalto, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal.
Após romper o cordão policial, simpatizantes do ex-presidente de direita Jair Bolsonaro atacaram violentamente as instalações e espancaram alguns policiais que tentaram contê-los.
Em vídeos veiculados nas redes sociais, muitos dos participantes documentaram a destruição e os ataques a policiais, embora também circulassem gravações em que policiais uniformizados eram vistos em atitude aparentemente passiva enquanto os manifestantes perpetravam a ocupação.
Em poucos minutos de confusão e alegria, a cena das enfáticas estruturas do arquiteto Oscar Niemeyer cercadas por centenas de pessoas pedindo a renúncia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e uma intervenção militar, foi veiculada nas redes sociais, há apenas uma semana depois que o líder do Partido dos Trabalhadores (PT) assumiu seu terceiro mandato. No meio do estupor, a pergunta era a mesma: como foi possível essa irrupção?
um funcionário chave
Os manifestantes, identificados com o ex-presidente do Brasil, não surgiram do nada. Nos últimos dois meses, muitos deles acamparam perto do Quartel General do Exército, onde se reuniram para ignorar o resultado da eleição mais disputada da história do país.
Sob as teorias de fraude que não conseguiram provar, os radicais exigem a divulgação do “código-fonte” que verificaria a suposta fraude nas eleições passadas, que deram a vitória a Lula com pouco mais de 1% dos votos.
As faixas com essa mensagem tremulavam durante a tomada dos três poderes, enquanto o resto do país começava a questionar quem era o responsável pela situação. Os primeiros holofotes se voltaram para o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, que garantiu ter dado ordem a todas as forças policiais para conter os manifestantes.
Porém, horas depois, o vereador anunciou a exoneração de seu secretário de Segurança Pública, Anderson Torres, que atuou como ministro da Justiça do Governo Bolsonaro, entre 2021 e 2022.
Rocha também pediu desculpas a Lula e aos demais poderes atacados durante o dia: “O que aconteceu hoje foi inaceitável. […] São verdadeiros vândalos, verdadeiros terroristas”, afirmou em vídeo divulgado nas redes sociais.
Relatos da imprensa local garantem que o ex-funcionário está de férias nos Estados Unidos, o que gerou uma onda de repúdio e um pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) para processá-lo como suposto responsável pelos desmandos
Bolsonaro, por sua vez, está nos Estados Unidos.Sua passagem por território norte-americano ocorreu dias antes da cerimônia de posse de Lula, o que não só fez do ex-presidente o grande ausente da transferência, como selou seu silêncio contundente sobre a derrota eleitoral.
Intervenção em Brasília
As palavras mais esperadas do dia eram as de Lula. O presidente interveio para condenar o acontecimento “sem precedentes na história” do Brasil e emitir um decreto que lhe permite militarizar o Distrito Federal, por meio de uma intervenção que vigorará até o próximo dia 31 de janeiro.
Ricardo García Capelli, atual secretário executivo do Ministério da Justiça, foi a pessoa nomeada controladora e que, dentre suas atribuições, terá a faculdade de solicitar aos órgãos civis e militares, da administração pública federal, todos os meios necessários para realizar sua tarefa. .
Lula defendeu o decreto como uma medida necessária dada a magnitude dos acontecimentos, e que comprometiam “seriamente” a ordem pública, atribuindo também a responsabilidade ao seu antecessor.
“Isso também é responsabilidade dele e dos partidos que pertencem a ele [Bolsonaro]”, denunciou Lula, após relembrar os discursos da extrema direita para atacar os poderes do Estado. Da mesma forma, afirmou que se algum membro de seu Governo facilitou a ação violenta em Brasília “por omissão”, deverá assumir o que lhe corresponde perante a Justiça.
El presidente de Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva.Mateus Bonomi /AGIF/Sipa USA / Legion-Media
O presidente anunciou que viajará a Brasília para verificar a magnitude dos estragos causados em prédios do poder público, e garantiu que esse tipo de ação não se repetirá.
“Perdi as eleições de 1989, perdi as eleições de 1994, perdi as eleições de 1998, e em nenhum momento você viu militantes do meu partido ou de esquerda fazerem alguma humilhação a um presidente da República eleito”, lembrou a história do líder da Partido dos Trabalhadores (PT).
Recaptura, prisões e investigações
Após o discurso do presidente brasileiro, porta-vozes do Congresso se juntaram às vozes de repúdio aos atos de vandalismo, enquanto o Supremo Tribunal Federal do Brasil acatou a decisão das autoridades federais na capital.
Pouco depois, a mídia local anunciou a retomada das instalações, enquanto a Polícia Civil confirmou a prisão de 300 manifestantes.
Enquanto isso, o Partido Liberal – que defendia Bolsonaro – se distanciou dos violentos protestos, embora em tom ambíguo reclamasse o acampamento em frente ao Quartel.
“É uma pena para todos nós, eles não representam o nosso partido nem o Bolsonaro”, afirmou o presidente do Partido Liberal, Valdemar Costa Neto, em comunicado divulgado nas redes sociais. Nesse vídeo, o porta-voz assegurava que as movimentações realizadas pelos militantes de Bolsonaro “foram todas pacíficas”.
Recaptura, prisões e investigações
Após o discurso do presidente brasileiro, os porta-vozes do Congresso se juntarão às vozes de repúdio aos atos de vandalismo, enquanto o Supremo Tribunal Federal do Brasil acata a decisão das autoridades federais na capital.
Pouco depois, a mídia local anunciou a retomada das instalações, enquanto a Polícia Civil confirmou a prisão de 300 manifestantes.
Enquanto Iso, ou o Partido Liberal – defendido por Bolsonaro – distanciou dois protestos violentos, abraçando uma reivindicação ambígua ou acampamento em frente ao Quartel.
“É uma pena para todos nós, eles não representam o nosso partido nem o Bolsonaro”, afirmou o presidente do Partido Liberal, Valdemar Costa Neto, em comunicado divulgado nas redes sociais. Neste vídeo, o porta-voz garantiu que os movimentos realizados pelos militantes de Bolsonaro “foram todos pacíficos”.
200 anos se passaram desde que o Brasil deixou de ser uma colônia. O período se inicia com a invasão do território nacional pelos colonizadores.
Mas, diferentemente da grande maioria dos países latino-americanos, o Brasil não passou de colônia em república, mas de colônia em monarquia. Por quê? Qual é o significado desta passagem anômala no continente?
Na grande maioria dos países latino-americanos, a independência significou uma ruptura com os colonizadores, bem como o fim da escravidão. No caso do Brasil, ao contrário, a data significou a chegada da família real portuguesa ao Brasil, estreitando os laços com o país, ao abandonar Portugal às tropas napoleônicas. A Espanha, ao contrário, havia resistido a essa invasão, que enfraqueceu seu poder militar e favoreceu sua derrota contra os países latino-americanos.
Colonizados e colonizadores
Assim, o Brasil passou de colônia a monarquia, fortalecendo, ao invés de distanciar, os laços com os colonizadores. A ponto de seu primeiro monarca ser filho do monarca português. E nessa frase, que advertia que um aventureiro deveria ser impedido de se apropriar da coroa, os aventureiros eram os brasileiros, entre eles o atual herói nacional, Tiradentes (foto). A “independência ou morte” não se referia à independência do Brasil, mas à permanência do vínculo com Portugal. O Brasil não teve os heróis da independência como Bolívar, San Martín, O’Higgins, Sucre, entre outros, como outros países da América Latina e Caribe.
Ao mesmo tempo, a escravidão no Brasil não acabou com o fim da colônia. Os dois fatores estavam intrinsecamente ligados, segundo a análise de Caio Prado Jr. Em 1859, foi promulgada uma Lei de Terras, que formalizou a posse das terras dos que as apropriaram. Assim, quando a escravidão acabou no final do século XIX, os novos homens livres não tinham acesso à terra. Deixaram de ser escravos, mas continuaram pobres, sem terra.
Desta forma, a questão colonial estava ligada à questão étnica e à questão social e nacional. O Brasil foi o país da América Latina e do Caribe que mais tarde acabou com a escravidão. E a república só se estabeleceu no final do século XIX, como uma espécie de movimento militar, sem qualquer tipo de participação popular, protagonizado pelos militares. Transito
Do ponto de vista da dependência externa, já havia ocorrido a transição da dependência portuguesa para a dependência britânica, que se consolidou a partir desse momento.
Temos que celebrar esse tipo de independência? Temos que entender o seu significado. Entenda como essa independência frustrante teve efeitos no futuro do país.
Primeiro, por ter estendido a escravidão por quase mais um século. Segundo, por não ter iniciado a construção do Estado nacional na época do fim da colônia. Com todas as consequências que isso acarreta.
Como disse Spinoza: Nem chore nem sorria: entenda.
Até poucos dias atrás, Celso Campilongo, diretor da tão tradicional e centenária Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, era desconhecido fora do meio jurídico brasileiro. Pois bem, ficou conhecido porque nessa qualidade teve de publicar um longo manifesto redigido conjuntamente por uma vasta gama de juristas, juristas e dirigentes políticos, defendendo – em termos amplos, sem citar nenhum nome, nenhum partido – as instituições, leia-se, o Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com certa ênfase no sistema eleitoral e democrático nascido com a Constituição de 1988.
Campilongo admitiu, ao lançar o texto, em 26 de julho, que esperava conseguir cerca de 300 adesões. Erro tremendo: em 24 horas as assinaturas já somavam 100.000. E no último final de semana já ultrapassaram a marca de meio milhão.
Por mais vagos que sejam os termos – e vale reiterar: intencionalmente vagos – o texto chega plenamente ao fígado do desequilibrado presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro.
O próprio título do documento, escrito – segundo os comentários mais comuns – não no português falado no Brasil, mas numa língua rara e complexa chamada “juridiqués”, devido ao seu tom eminentemente jurídico, é enfadonhamente amplo: “Carta aos Mulheres brasileiras e brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito”.
Resumindo: “Carta em defesa da democracia”, ou seja, contra tudo o que Bolsonaro está tentando fazer.
Entre os assinantes estão desde banqueiros a ex-membros do Supremo Tribunal Federal, de sindicatos à poderosa Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, de intelectuais e artistas como Chico Buarque e Caetano Veloso a ex-ministros de governos anteriores, de professores universitários a estudantes e, claro, as pessoas.
Sabe-se que manifestações escritas massivas não têm, nem remotamente, o mesmo efeito das manifestações de rua, que por ora são resumidas, no Brasil, pelos defensores de Bolsonaro.
E isso, se considerarmos que os desfiles de motos que reúnem quatro ou seis mil pessoas são “manifestações de massa”.
Não há oposição, por enquanto graças ao medo da reação dos grandes grupos de capangas armados, os chamados “milícias”, mobilizados por Bolsonaro e seus filhos trogloditas.
Mas essa Carta teve um efeito imediato e contundente sobre a figura bizarra do patético e perigoso extrema-direita.
Primeiro, ficou claro que os donos do dinheiro, protegidos pela Federação Brasileira de Bancos, não estão mais com ele.
Em segundo lugar, que um grande setor do agronegócio também saltou do navio da extrema direita – não por razões ideológicas e muito menos morais, mas por puro interesse em defender seus bolsos muito bem alimentados.
E terceiro, e talvez mais importante, constata-se que o apoio a Bolsonaro por partidos políticos de direita oscila cada vez mais, não ao sabor do vento, mas dos benefícios a serem negociados em termos de absoluta urgência, antes de sua derrota .
Cresce o desespero da extrema-direita, acentua-se seu desequilíbrio, e quanto mais claro fica o panorama de sua possível derrota em um primeiro turno, mais tentativas aparecem para preservá-lo da justiça ao ser expulso da cadeira presidencial.
Naqueles dias, a mobilização ganhou alguma força para que o Congresso, dominado – melhor dizendo: literalmente alugado, porque no Brasil essa ala é alugada para qualquer um – por Bolsonaro tentasse aprovar uma emenda constitucional que garanta, a todos os ex-presidentes, uma fórum, nomeando-os senadores vitalícios.
Algo semelhante existe no Paraguai, algo semelhante foi imposto no Chile após a queda do sanguinário Augusto Pinochet.
No caso brasileiro, porém, o tiro pode sair pela culatra.
É que, sem as imunidades, Jair Bolsonaro cairá na muito, muito lenta Justiça de Primeira Instância, o que poderia favorecê-lo.
Já com a imunidade de senador vitalício, ele cairá no Supremo Tribunal Federal, cada vez mais claramente indignado não só por seus ataques ferozes e diários à democracia, mas também pela compra que realiza para impedir qualquer um dos 147 pedidos de deposição sai da gaveta do muito corrupto presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira.
Ou seja: se o futuro do meu pobre país continua cada vez mais nebuloso, o do pior e mais imundo presidente da história brasileira fica cada vez mais claro.
Luiz Inácio Lula da Silva concorrerá às eleições presidenciais em outubro de 2022. Foto: Ricardo Stuckert.
Pesquisa do instituto Datafolha no Brasil registrou nesta quinta-feira que o líder do Partido dos Trabalhadores (PT), Luiz Inácio Lula da Silva, supera o presidente Jair Bolsonaro com mais de 20 pontos em intenção de voto, antes das eleições presidenciais do próximo Outubro.
De acordo com os resultados, a intenção de votar a favor de Lula é de 48%, o que representa um aumento de cinco pontos em relação ao obtido na última pesquisa.
Lula amplia a vantagem na intenção de voto sobre Bolsonaro para 21 pontos nas eleições presidenciais e pode vencer no primeiro turno. Com 7% aparece Ciro Gomes. Também aumentou a diferença na votação de 21 para 25 pontos a favor do petista. Pesquisa Datafolha 26/05
Por sua vez, o presidente Bolsonaro conseguiu um aumento de um ponto desde a última pesquisa, para um total de 27 por cento de apoio.
Em terceiro lugar está Ciro Gomes com 7 por cento, seguido de André Janones e Simone Tebet com 2 por cento cada.
Nesta pesquisa, o apoio a Lula se destaca entre os eleitores entre 16 e 24 anos, com 58%.
2.556 eleitores, maiores de 16 anos, participaram da pesquisa nos dias 25 e 26 de maio em 181 cidades diferentes do país, com margem de erro de 2%.
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro. Foto: Sérgio Lima/AFP
A Polícia Federal concluiu nesta quarta-feira que o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, cometeu um crime ao vazar documentos confidenciais em uma transmissão ao vivo com a intenção de desacreditar o sistema eleitoral. No entanto, ele não acusou Bolsonaro de estar protegido e o caso agora está nas mãos do Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo a Polícia, a divulgação destes dados confidenciais teve repercussões nefastas para a administração pública e serviu para “divulgar” informação “conhecidamente falsa”.
A corporação encaminhou documento ao juiz Alexandre de Moraes, do STF, responsável pelo caso, que encaminhará as conclusões ao Ministério Público. Isso deve decidir se deve denunciar, continuar investigando ou arquivar o caso.
Há alguns meses, o presidente divulgou nas redes sociais um inquérito policial sobre um suposto ataque ao sistema interno do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2018. O juiz Alexandre de Moraes incluiu a questão em um processo sobre disseminação de notícias falsas e ataques às instituições.
O presidente passou anos com uma campanha para difamar o sistema eleitoral brasileiro, um dos mais informatizados do mundo e em vigor desde 1996. As tensões causadas por seus comentários chegaram às ruas há alguns meses com ataques diretos a Moraes.
Bolsonaro não aparece
Na semana passada, Bolsonaro não compareceu à sede da Polícia Federal onde deveria comparecer, mas, segundo a delegada Denisse Ribeiro, esse fato não impediu a análise do caso.
Por sua vez, nesta terça-feira, o presidente do TSE, juiz Luís Roberto Barroso, considerou que o vazamento de Bolsonaro serviu para que as milícias digitais colocassem em risco a segurança do sistema.
“O Presidente da República vazou a estrutura interna das Tecnologias de Informação do Tribunal Superior Eleitoral. Tivemos que tomar várias medidas para fortalecer a segurança cibernética de nossos sistemas para nos proteger. Faltam adjetivos para descrever a atitude deliberada de facilitar a exposição do processo eleitoral brasileiro a ataques de criminosos”, afirmou.